3 Tentativas de golpes de estado que fracassaram no Brasil

A história política do Brasil é marcada por instabilidade e tentativas de ruptura democrática. Enquanto golpes como os de 1889 (Proclamação da República) e 1964 (Ditadura Militar) tiveram sucesso, outras conspirações fracassaram, mas deixaram marcas profundas. Este artigo examina quatro tentativas de golpe que não deram certo, explorando seus contextos, protagonistas e consequências para a política nacional.
Levante Integralista (1938)
A Ação Integralista Brasileira (AIB), movimento ultranacionalista inspirado no fascismo europeu, teve um papel significativo no cenário político da década de 1930. Inicialmente, seus membros apoiaram Getúlio Vargas, acreditando que ele compartilhava sua visão autoritária. No entanto, em 1937, com a decretação do Estado Novo, Vargas extinguiu todos os partidos políticos, incluindo a AIB. Essa traição política gerou revolta entre os integralistas, que se sentiram excluídos do novo governo.
A insatisfação culminou em uma tentativa de golpe em 11 de maio de 1938. O plano envolvia militares simpatizantes do movimento e previa a ocupação de pontos estratégicos no Rio de Janeiro, como estações de comunicação, unidades militares e, principalmente, o Palácio do Catete, sede do governo federal. A ideia era capturar Vargas e forçar a ascensão dos integralistas ao poder.
No entanto, a operação revelou-se desorganizada e caótica. Os insurgentes conseguiram dominar alguns postos e avançaram até a residência presidencial, onde trocaram tiros com a guarda. Vargas e sua família estavam no local durante o ataque, o que elevou a tensão do confronto. Apesar do elemento surpresa, os golpistas não conseguiram consolidar suas posições e logo enfrentaram a resistência das forças leais ao governo. O líder do ataque, o tenente Severo Fournier, fugiu às pressas, e os rebeldes foram rapidamente dispersados ou presos.
O fracasso do levante integralista marcou o fim definitivo da influência da AIB na política brasileira. Muitos de seus membros foram perseguidos e presos, enquanto Vargas consolidava ainda mais seu controle sobre o país. Esse episódio evidenciou a fragilidade do movimento e reforçou a posição de Vargas como líder incontestável da nação até sua deposição em 1945.
Tentativa de deposição de Getúlio Vargas (1954)
No início da década de 1950, o Brasil vivia um período de instabilidade política e econômica. Getúlio Vargas, que retornara ao poder em 1951 pelo voto direto, enfrentava uma oposição intensa, principalmente da União Democrática Nacional (UDN) e de setores militares descontentes com sua política trabalhista e econômica.
Um dos pontos de maior atrito surgiu em 1953, quando Vargas nomeou João Goulart como ministro do Trabalho. Jango, como era conhecido, era um jovem político em ascensão e defensor de pautas sindicais, o que acendeu o alerta da oposição. A UDN e parte da imprensa viam sua atuação como um passo em direção a uma “República sindicalista”, supostamente inspirada no modelo peronista da Argentina. Embora essa ameaça nunca tenha se concretizado, a simples ideia causava grande resistência entre militares e conservadores.
A crise se intensificou em 1954, quando o governo propôs um aumento significativo do salário mínimo. A medida foi fortemente criticada por setores empresariais e pelas Forças Armadas, que consideravam o reajuste excessivo e prejudicial às contas públicas. Em fevereiro, um grupo de coronéis do Exército divulgou um manifesto acusando Vargas de comprometer a estabilidade do país. A pressão foi tanta que Goulart acabou deixando o ministério.
No entanto, a instabilidade continuou e atingiu seu auge em agosto de 1954, quando ocorreu o Atentado da Rua Tonelero. O jornalista e político Carlos Lacerda, um dos principais opositores de Vargas, foi alvo de um atentado que resultou na morte do major Rubens Vaz, da Aeronáutica. As investigações ligaram o crime a Gregório Fortunato, chefe da guarda presidencial. O episódio aumentou ainda mais a crise e gerou um novo manifesto militar exigindo a renúncia de Vargas.
Encurralado e sem apoio político, Vargas viu sua base de sustentação desmoronar. Na madrugada de 24 de agosto de 1954, em meio à iminente deposição, ele se suicidou no Palácio do Catete. Sua morte gerou uma comoção nacional e desarticulou momentaneamente os planos de golpe da oposição, mas os militares que participaram da conspiração continuaram a influenciar a política brasileira. Muitos deles desempenhariam papéis centrais no golpe de 1964, que instaurou a ditadura militar no país.
Esse episódio demonstrou como as disputas políticas e militares moldaram o cenário brasileiro e anteciparam eventos que viriam a definir os rumos da nação nas décadas seguintes.
Campanha da Legalidade (1961)
Entre o final de agosto e o início de setembro de 1961, o Brasil viveu um dos momentos mais tensos de sua história política: a Campanha da Legalidade. Esse movimento foi liderado pelo então governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, em resposta à tentativa de impedir a posse do vice-presidente João Goulart após a renúncia inesperada de Jânio Quadros no dia 25 de agosto.
A crise teve início quando Jânio Quadros surpreendeu o país ao deixar o cargo, criando um vácuo de poder que foi rapidamente explorado por setores contrários à posse de Goulart. À época, Jango estava em uma viagem oficial pela Ásia, incluindo países do bloco socialista, o que intensificou a resistência de grupos conservadores que o associavam a ideais comunistas. Diante dessa situação, setores militares e políticos começaram a se articular para impedir sua ascensão à Presidência do Brasil.
A tensão se agravou a ponto de o Brasil correr o risco de uma guerra civil. Para garantir que a Constituição fosse respeitada, Leonel Brizola iniciou uma mobilização em defesa da legalidade e da democracia. A partir do Palácio Piratini, sede do governo gaúcho, ele organizou a Rede da Legalidade, um sistema de rádio que transmitia informações e inflamava a resistência popular. A movimentação reuniu milhares de pessoas em Porto Alegre e em outras partes do país, determinadas a garantir que João Goulart assumisse o cargo para o qual havia sido eleito.
No auge da Campanha da Legalidade, Brizola fez discursos marcantes, demonstrando que a luta pela democracia brasileira exigia determinação. Em uma de suas falas mais emblemáticas, ele declarou que a resistência não partiria para o ataque, mas que, caso fosse necessário revidar, a resposta seria certeira. Esse episódio reforça como, em diferentes momentos da história do Brasil, a ordem democrática esteve ameaçada e precisou ser defendida com a participação popular.
A pressão exercida pelo movimento surtiu efeito, e João Goulart tomou posse no dia 7 de setembro de 1961. No entanto, como forma de conciliação, ele assumiu sob um regime parlamentarista, com poderes reduzidos. Essa nova configuração política durou até janeiro de 1963, quando um plebiscito restaurou o presidencialismo.
Fonte: BBC.